Fechamento de TV na Venezuela é ato grotesco de Chávez
por William Waack
Hugo Chávez fechará domingo a cadeia de TV mais popular da Venezuela, e que lhe faz oposição. Mesmo que ele fechasse a mais desconhecida estação de rádio ou o jornal de menor tiragem, para mim não faz a menor diferença: é um ato grotesco, arbitrário e ofensivo aos princípios básicos de liberdade de expressão, fundamentais para qualquer sociedade tolerante, pluralista e aberta.
Pouco me importa também se Chávez o faz em nome do “socialismo do século 21”, da “revolução bolivariana” ou de qualquer outra coisa que ele invente para dar rótulo aceitável a algo que não passa de um projeto autoritário, demagógico e retrógrado. Ao longo da minha carreira de repórter desenvolvi um profundo desprezo por tiranos, ou candidatos a tiranos, que se referem à “vontade popular” (que eles, lógico, representam, interpretam e manipulam) como justificativa para seus atos.
Chávez acusa a emissora que ele vai fechar de ter sido golpista e apoiado quem tentou tirá-lo do poder. Não é motivo para tirá-la do ar. Havia leis e tribunais na Venezuela habilitados a punir o que possa ser considerado abuso. Parece-me que Chávez se faz de vítima quando, na minha opinião, é o agressor. Está empenhado no controle à informação como elemento vital para a consolidação do poder pessoal. Calar as vozes desconfortáveis fez parte de todo regime arbitrário.
Aprendi na minha vida como enviado especial a dezenas de crises, conflitos, guerras e convulsões políticas e sociais, nos mais diversos países e regimes, que princípios têm de ser universais e têm de valer para qualquer lugar. Não posso achar que liberdade de expressão merece ser defendida quando é conveniente fazê-lo em função das minhas convicções políticas ou alianças do momento. Ou que o cerceamento a liberdades individuais possa ser tolerado em função de “componentes culturais” de uma sociedade ou país determinado.
Uma das mais belas tradições jornalísticas, que une profissionais do mundo inteiro por cima de barreiras políticas, religiosas e sociais, é a da resistência à tentativa de manipulação da informação, à agressão à liberdade de imprensa e ao cinismo com que ativistas políticos (não importa sua tendência, se “esquerda” ou “direita”) tentam fazer do direito de expressão uma categoria elástica e adaptada a seus interesses. Por isso tenho desprezo também pelos que levam na sua carteirinha profissional a designação “jornalista”, mas submetem o princípio da liberdade de expressão à conveniência política do momento.
Um dos meus heróis modernos é o filósofo espanhol Miguel de Unamuno, que enfrentou com palavras, na universidade de Salamanca, em 1936, a onda sanguinária franquista. “Vencerão mas não convencerão”, disse ele, olho no olho, a uma besta truculenta, um general que comandava suas tropas com o grito “viva a morte”. “Vencerão porque têm a força bruta, mas lhes falta a razão”.
Sobra força a Chávez, e nenhuma razão.
por William Waack
Hugo Chávez fechará domingo a cadeia de TV mais popular da Venezuela, e que lhe faz oposição. Mesmo que ele fechasse a mais desconhecida estação de rádio ou o jornal de menor tiragem, para mim não faz a menor diferença: é um ato grotesco, arbitrário e ofensivo aos princípios básicos de liberdade de expressão, fundamentais para qualquer sociedade tolerante, pluralista e aberta.
Pouco me importa também se Chávez o faz em nome do “socialismo do século 21”, da “revolução bolivariana” ou de qualquer outra coisa que ele invente para dar rótulo aceitável a algo que não passa de um projeto autoritário, demagógico e retrógrado. Ao longo da minha carreira de repórter desenvolvi um profundo desprezo por tiranos, ou candidatos a tiranos, que se referem à “vontade popular” (que eles, lógico, representam, interpretam e manipulam) como justificativa para seus atos.
Chávez acusa a emissora que ele vai fechar de ter sido golpista e apoiado quem tentou tirá-lo do poder. Não é motivo para tirá-la do ar. Havia leis e tribunais na Venezuela habilitados a punir o que possa ser considerado abuso. Parece-me que Chávez se faz de vítima quando, na minha opinião, é o agressor. Está empenhado no controle à informação como elemento vital para a consolidação do poder pessoal. Calar as vozes desconfortáveis fez parte de todo regime arbitrário.
Aprendi na minha vida como enviado especial a dezenas de crises, conflitos, guerras e convulsões políticas e sociais, nos mais diversos países e regimes, que princípios têm de ser universais e têm de valer para qualquer lugar. Não posso achar que liberdade de expressão merece ser defendida quando é conveniente fazê-lo em função das minhas convicções políticas ou alianças do momento. Ou que o cerceamento a liberdades individuais possa ser tolerado em função de “componentes culturais” de uma sociedade ou país determinado.
Uma das mais belas tradições jornalísticas, que une profissionais do mundo inteiro por cima de barreiras políticas, religiosas e sociais, é a da resistência à tentativa de manipulação da informação, à agressão à liberdade de imprensa e ao cinismo com que ativistas políticos (não importa sua tendência, se “esquerda” ou “direita”) tentam fazer do direito de expressão uma categoria elástica e adaptada a seus interesses. Por isso tenho desprezo também pelos que levam na sua carteirinha profissional a designação “jornalista”, mas submetem o princípio da liberdade de expressão à conveniência política do momento.
Um dos meus heróis modernos é o filósofo espanhol Miguel de Unamuno, que enfrentou com palavras, na universidade de Salamanca, em 1936, a onda sanguinária franquista. “Vencerão mas não convencerão”, disse ele, olho no olho, a uma besta truculenta, um general que comandava suas tropas com o grito “viva a morte”. “Vencerão porque têm a força bruta, mas lhes falta a razão”.
Sobra força a Chávez, e nenhuma razão.
William Waack nasceu em São Paulo, SP em 30/08/1952 é jornalista, formado pela USP. Cursou também Ciências Políticas, Sociologia e Comunicação na Universidade de Mainz, na Alemanha, e fez mestrado em Relações Internacionais. Tem quatro livros publicados e já venceu duas vezes o Prêmio Esso de Jornalismo, pela cobertura da Guerra do Golfo de 1991 e por ter revelado informações sobre a Intentona Comunista de 1935, até então mantidas sob sigilo nos arquivos da antiga KGB em Moscou. Waack trabalhou em algumas das principais redações do Brasil, como o Jornal do Brasil, O Estado de S. Paulo e a revista Veja. Foi editor de Economia, Internacional e Política. Durante 20 anos, William Waack foi correspondente internacional na Alemanha, no Reino Unido, na Rússia e no Oriente Médio. Desde 1996, trabalha para a TV Globo e voltou ao Brasil em 2000. Apresenta, desde maio de 2005, o Jornal da Globo e em 2006, passou a assinar uma coluna na editoria Mundo do portal de notícias G1.
Publicado no Portal G1.
Quinta-feira, 24 de maio de 2007.
http://bootlead.blogspot.com
Venezuela TV-Chávez
No comments:
Post a Comment