Wednesday, June 25, 2008

Senhores! As "cartas" estão na mesa. Vamos ao "jogo"?











































A insensatez marcha no Morro da Providência
por José Nêumanne

A tragédia do Morro da Providência, no Rio de Janeiro, poderia figurar como ilustração atualizada no clássico da historiografia A Marcha da Insensatez, de Barbara W. Tuchman, que relata como, desde Tróia até o Vietnã, alguns governos perseguem objetivos contrários aos próprios interesses.

Incapazes de enfrentar o problema da violência, anabolizada pelo crime organizado, que vende entorpecentes e contrabandeia armas, e de combater o mal endêmico da corrupção policial, governadores fluminenses sempre apelaram à União por uma intervenção militar nos territórios sem lei das favelas do Rio. Da mesma forma como não resistiu à tentação de mandar tropas cumprir a tarefa de Sísifo de impor a lei no Haiti, o governo federal, chefiado pelo petista Lula da Silva, cometeu a insensatez de atender ao pedido, contrariando a maioria dos oficiais das Forças Armadas e a unanimidade dos especialistas em segurança pública. Com a mesma fé que devota à própria infalibilidade e à capacidade de transferi-la à "companheirada" antiga ou moderna, o papa Lula Único se investiu da convicção inabalável de que a farda do Exército seria impermeável aos esgotos morais que infestam a periferia carioca. Mas não ficou nisso e foi além: em nome do "social", que tudo justifica, ele ungiu projeto do senador Marcelo Crivella, maioral da Igreja Universal do Reino de Deus, senador da República e um dos candidatos oficiais à Prefeitura da ex-Cidade Maravilhosa, permitindo que o Ministério das Cidades o bancasse e o da Defesa o protegesse. Seria injusto atribuir à permissão intenções sub-reptícias de desmoralizar uma instituição com a tradição do Exército Nacional, como vingança por causa dos sobrevôos de helicópteros nas assembléias de metalúrgicos grevistas sob o comando de Lula, então líder sindical, ou dos processos em que ele foi réu na Justiça Militar na ditadura. O que determinou a decisão foram intenções mais rápidas e rasteiras: o interesse eleiçoeiro e a garantia da futura falta de cobrança.

Dado o primeiro passo para a insensatez, os seguintes se tornaram inexoráveis: quem joga uma maçã no esgoto não pode esperar que ela seja retirada limpa e pronta para ser comida. A crônica dos três rapazes abordados pela patrulha encarregada de proteger a obra do candidato Crivella e entregues aos chefões do tráfico do morro rival foi mais anunciada que espetáculo de Paixão de Cristo em circo mambembe na Semana Santa. Contribuiu para o desfecho trágico a circunstância particular da infelicidade das vítimas de cruzarem com um tenente inconseqüente, assim como poderiam ter sido raptadas pelas hostes rivais ou atingidas por balas perdidas, tão comuns no cotidiano deles como a miséria com que conviviam. O Estado é responsável por haver abandonado o território das favelas dos Morros da Providência e da Mineira e entregado, na prática, as miseráveis comunidades que nelas moram à tirania sangrenta de delinqüentes que fazem o serviço sujo para o baronato do crime organizado.

A transformação de tropas do Exército em escolta para dar segurança a um projeto de promoção política de um candidato aliado foi o movimento seguinte na marcha da insensatez. Nesta ofensiva, o desatino do oficial e a cegueira obediente de seus subordinados foram meros aditivos à insensatez sistêmica do Estado incapaz, ineficaz e brutal e de seus gestores, que vendem a alma ao diabo pela permanência no poder em troca do absoluto abandono dos escrúpulos. Não se trata de inculpar apenas o Executivo. Os legisladores, mesmo os adversários de Crivella, nada fazem para garantir a igualdade de oportunidades nas normas que presidem as disputas eleitorais porque eles próprios esperam um dia poder delas se locupletar. A Justiça Eleitoral, seduzida pela possibilidade de exercer poderes censórios em plena democracia, multando quem entrevista candidatos, nada fez para impedir o abusivo uso da máquina pública para favorecer o candidato oficial e, depois da tragédia, embargou a obra, decisão tardia e questionável (e o PAC, hein?). Pois é mais fácil multar empresas de comunicação que enquadrar o poder maior, impedindo que o favorecimento de seus sequazes nele perpetuem seus atuais ocupantes.

A culpa maior é de quem deu a ordem de partida para a marcha da insensatez. Mas convém lembrar que os subordinados também foram cúmplices. O comandante da Força nunca se disse contrariado por vê-la usada para proteger interesses subordinados. Nenhum oficial sob suas ordens imitou o capitão Sérgio Macaco, que, na ditadura, denunciou a loucura de seu comandante, que planejou explodir o gasômetro no Rio para, depois, inculpar os guerrilheiros de esquerda na guerra suja. Nenhum prócer de um partido da oposição denunciou a infâmia de uma obra financiada pelo erário com fins eleiçoeiros, a pretexto do "social", que tudo justifica e tudo permite. Nenhum desses promotores fanáticos por fama exigiu o fim dela.

A 11 dias da tragédia, o mandante das torturas e das mortes e seus executantes estão livres e comandam o tráfico na favela. A polícia fluminense, tão diligente em acusar os militares que entregaram as vítimas aos algozes, não prendeu nem processou o chefão do tráfico e seus esbirros. O ministro da Defesa subiu o morro para pedir desculpas, expediente grato ao atual governo e ao qual também apelaram os protagonistas militares, com idêntico oportunismo. O ministro da Justiça não perdeu a ocasião de bajular o chefe, dizendo que Lula se opunha a usar o Exército no combate ao tráfico. E este agiu como se fosse um ombudsman ao classificar de "injustificável" a presença das tropas sob seu comando no morro, além de ter prometido indenizar as famílias das vítimas, como se o vil metal bastasse para limpar a sujeira e a sangria desta tragédia impune e anunciadíssima.


José Nêumanne Pinto é um escritor, jornalista e poeta, nascido em Uiraúna (PB), em 18 de maio de 1951. Começou sua carreira jornalística no "Diário da Borborema", Campina Grande (PB), como repórter em 1968. Recebeu os prêmios Esso de Jornalismo Econômico em 1975, pela série "Perfil do Operário Brasileiro Hoje" e o Troféu Imprensa de Reportagem Esportiva, também em 1975, pela reportagem "Éder Jofre e o Boxe Brasileiro". Nêumanne foi colunista, com um artigo semanal sobre Brasil na edição em castelhano do jornal "Miami Herald" . Atualmente reside em São Paulo, onde é articulista periódico do jornal "O Estado de S. Paulo", do "Jornal da Tarde" e do "Jornal de Brasília", além de publicar seus artigos em diversos órgãos da imprensa nacional. Como escritor José Nêumanne tem diversos livros publicados, também é editor do blog "Estação José Nêumanne" sobre poesia, jornalismo e literatura. E-mail: neuman@estado.com.br


Publicado no jornal "O Estado de S.Paulo".
Quarta-feira, 25 de junho de 2008.






Pela porta dos fundos, não – "O Estado de S. Paulo"

6 comments:

Anonymous said...

A força verde -oliva, já nem tão oliva, foi reduzida à segurança de pedreiros.


Viva o "puteiro nacional"!!!

CAntonio said...

É sempre bom ler algo do Nêumanne.

Mas, tenho algumas restrições a ele.

Veja só o e-mail que enviei a ele tempos atrás:

"Caro José Nêumanne,

Vasculho por toda a mídia não-virtual e não consigo encontrar uma única linha a respeito do Fôro de São Paulo.

Estariam todos "dominados", o assunto é irrelevante ou todos foram afetados pela bactéria da amnésia que atingiu sua excelência o presidente?

Será tão difícil explicar aos menos avisados do que se trata?

Saudações,"


A resposta do Nêumanne, crua e dura:

"não há complicação nenhuma para entender, Antônio: o foro de São Paulo não é notícia, porque não é notícia. veículos de comunicação não lidam com idéias, ameaças ou esperanças, mas lidam apenas com notícias.
grande abraço
Nêumanne"


Aproveitando a passagem informo qu também o indiquei ao Premio Comprometido en defensa de la Libertad y la democracia.



GrandAbraço

Anonymous said...

Caro irmão boot. Texto coerente com causas e consequências. Entendemos que o jogo a ser jogado usando as cartas que você com muita arte colocou na mesa deverá ser o truco. Por quê? o coringa entra, mas é carta sem valor... abração

Anonymous said...

A LINHA DE YENAN
Antes da tomada do poder, pelos comunistas na China, o líder Mao Tse Tsung,convenceu-se de que, a tese Marxista-Lenista, da Revolução Proletária, sob o comando da classe operária, deveria sofrer modificações,de ordem prática, nos países atrasados, hoje “emergentes”. Em tais países o proletariado era escasso e despreparado para constituir a maioria atuante, que sob o comando de revolucionários profissionais, militarmente, preparados, viria a ser a vanguarda da Revolução. A experiência demonstrou que não pode ser aplicada em toda parte, nem na própria Rússia cujo o êxito da Revolução foi, devido a infiltração no exército do Czar e ao “apodrecimento” das instituições e dos grupos dirigentes. Em suma: a massa campesina, deve ser motivada, a classe média, deve ser neutralizada e nas Forças Armadas, é indispensável que sejam infiltradas para serem desmoralizadas. Utiliza-se para isso,um grupo reacionário e corrupto, que irá provocar, pela ação e pela omissão, o desmantelamento das instituições sociais, utilizando-se, para isso, da própria estrutura do Estado para destruí-lo, tudo em nome da “legalidade”; a qual não é confundida com o respeito às leis, pois está, é mera contrafação daquela. A corrupção, a qual as esquerdas, esforçaram-se para não participar, vem a ser seu melhor cartão de apresentação, as lutas sociais, da base da pirâmide, ou a exploração das contradições do sistema, tornam-se fases necessárias à ascensão e perpetuação no poder. Esta é a “ Linha de Yenan”, ela foi vitoriosa na China. Causa-me uma certa estranheza, os últimos episódios que envolvem o Exército Brasileiro, justamente uma semana após as nossas Forças Armadas,aparecerem com 79% de aprovação,Associação dos Magistrados do Brasil,em primeiro lugar,a frente de instituições como:Polícia Federal e Igreja Católica. A criação do Ministério da Defesa, teve muitas motivações. O emprego do Exército como moeda política,não era uma delas, mas podia ser vislumbrada. Daí,seu emprego no Morro por ordem do Presidente, tudo para atender às aspirações políticas de um senador da república, da base de apoio ao governo federal.
Olha minha gente! Esta muito difícil para a classe média, sobreviver no Brasil de hoje. O atual governo beneficia os dois extremos da pirâmide social, os mais ricos, e na outra extremidade, de maneira clara os mais pobres, através de uma série de benefícios, chamados “bolsa alguma coisa”; e até com o perigoso expediente, de facilitar o acesso, irresponsável, ao crédito consignado, fatalmente, com o aumento dos juros, ocorrerá um aumento do índice de inadimplência futura. O atual governo, fala de uma realidade inexistente no país, dos pontos positivos, como se fossem todos de sua autoria, afirmando sempre, nada saber sobre os graves problemas existentes e que estão à espera de soluções. É o Brasil das ilusões, dos escândalos diários e que a tudo ignora. A desgraça alheia é a vitrine para a projeção de gregos e troianos.
Ainda haverá muito choro e ranger de dentes.

Suzy said...

Boot, essa "insensatez" tem método...

Anonymous said...

Vamos eleger lula


o mais inpto das Américas


http://listas.20minutos.es/?do=s...96& c=1214515553

 
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