Saturday, March 07, 2009

Seria o Congresso Nacional o nosso Karni Mata* (Templo dos Ratos)
e os deputados e senadores nossos "kabas" (ratos)?

Ilustração: © Revista Exame – Edição nº 0853 de 12/10/2005 por Dálcio Machado.
































Bombaim é aqui
por Nelson Motta

Além da grande diversão que me proporcionam as histórias de Glória Perez, os cenários deslumbrantes e a cultura indiana, toda vez que assisto a "Caminho das Índias" penso nos políticos brasileiros. Eu sempre penso neles.

Ah, como eles adorariam que aqui houvesse um sistema de castas com 50 milhões de dálits, de intocáveis - os excluídos dos excluídos. Para lutar por seus direitos e ganhar seus votos. Quantas ONGs, com dinheiro público, os dálits teriam no Brasil?

A bolsa-dálit seria imediatamente instituída, seriam criadas cotas para dálits em universidades, serviços públicos e até em empresas privadas. Para os dálits indianos, o Brasil seria o paraíso. E não haveria novela de Glória Perez.

Uma parte dos nossos políticos seria da casta dos xátrias, que nasceram dos braços de Brahma, como os militares e os governantes; outra dos vaixás, que saíram das pernas do criador, como os comerciantes e os agricultores; ou dos sudras, que saíram dos pés do deus como operários e camponeses; raros seriam brâmanes, que saíram da boca da divindade, como sacerdotes, filósofos e professores. Os companheiros dálits seriam apenas a poeira sob os pés de Lula, epa!, de Brama. Não da cerveja, do deus. Aqui, dálits unidos jamais seriam vencidos.

A organização familiar indiana, com filhos e netos morando com o patriarca, que tem autoridade absoluta, deve dar água na boca de nossos políticos. Principalmente porque o nepotismo na Índia é a regra, família trabalha com a família: caixa único.

Outro objeto de desejo deve ser a tradição de casamentos arranjados e negociados pelas famílias, em bens e em dinheiro vivo, que não chega a ser novidade na política brasileira, mas poderia ser usada de forma mais prática, em alianças eleitorais legais, à prova de TRE. Casamento por amor é coisa de novela.

Mas os políticos que assistem a "Caminho das Índias" devem tomar cuidado. Alguns podem se impressionar com as crenças hinduístas na reencarnação, no carma de cada um, e serem acometidos por pesadelos em que acordam como um chacal, uma hiena ou uma ratazana, zanzando pelo plenário, de paletó e gravata. Are baba!

*NR. O Templo dos Ratos - Karni Mata que fica no Estado do Rajastão (Índia), é considerado um dos locais santos dos hindus da Índia. Para os hindus, o templo é o local que habita Karni Mata - que seria a reencarnação de Durga - deusa do poder e da vitória e também para reverenciar os ratos (chamados Kabas), que são adorados e bem alimentados. Os hindus crêem que os corpos dos ratos sejam "casas" para as almas dos devotos de Karni Mata que já morreram.


Nelson Cândido Motta Filho, nascido em São Paulo em 29/10/1944, é jornalista, compositor, escritor, roteirista e produtor musical. Nelson Motta também já dirigiu shows no Brasil e no exterior e produziu discos de Elis Regina, Marisa Monte, Gal Costa, Daniela Mercury, entre outros. Nelson foi diretor artístico da gravadora Warner Music/Brasil, produtor da Polygran/Brasil, integrou por oito anos a mesa do programa "Manhattan Connection", da GNT/Globo, é também comentarista do noticiário "Jornal da Globo", além de colunista no jornal "O Globo". Nelsinho como é chamado pelos amigos, é autor do livro/biografia "Vale Tudo - O Som e a Fúria de Tim Maia", afora ser o criador e "management" do site/revista musical online "Sintonia Fina".



Publicado no jornal "O Globo".
Sexta-feira, 06 de março de 2009.




"Consciência social de brasileiro é medo da polícia" – Arnaldo Jabor





3 comments:

Anonymous said...

Muito boa a comparação. Só não sei se os ratos (os originais) gostarão dela. Grande abraço.

Marcos Pontes said...

Até surpreendente ler o Mota falar de política. E mais, falando bem. MAs, cá pra nós, já não existem castas nesta joça de país?

W.NETO said...

Meu caro BOOTLEAD, os dálits atualmente, são a classe média pagadora de pesados impostos! Só que para estes nenhuma ONG vê lucro em suas ações!
Um forte abraço!

 
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