Os aviões andaram bebendo
por Arnaldo Jabor
As coisas é que têm a culpa de tudo, o piano andou bebendo, 'the piano has been drinking!' cantou Tom Waits, 'my necktie is asleep', minha gravata está dormindo, 'the jukebox is taking a leak', a vitrola foi mijar, o tapete precisa de um corte de cabelo, o afinador de pianos é surdo e eu, cá comigo, continuo: os Boeings e legacies e airbuses andaram enchendo a cara também, enquanto os jornais teimam em nos propagar catástrofes que, no dizer das autoridades, se produziram sozinhas como cogumelos autóctones, enquanto o presidente some sob as vaias do Pan e, magoado, se esconde sob os terçóis do palácio, iluminado pela aura do botox que resplende da primeira-dama muda e as pistas dos aeroportos rolam de porre debaixo de chuva, as turbinas se revoltam, as asas tatalam e se partem, os motores se recusam a rodar e destroncam a língua em palavrões, as medalhas vêm pousar como gafanhotos nos peitos dos canalhas, os pepinos se enfiam no rabo dos brigadeiros, os mortos berram com orgulho que são cadáveres verde-e-amarelo, cem por cento nacionais e os 'groovings' não são 'groovy', as ranhuras viram regos arrombados, os pneus rebolam como gelatina, os trens-de-aterrisagem são aleijados, os radares são morcegos drogados e os controladores são cegos de um olho e não enxergam com o outro.
As petistas eróticas gozam fumando charutos, os puteiros erupem como vulcões de esperma na beira das pistas, no caminho dos 'airbuses', as gargalhadas roncam nas gargantas dos ministros, a palma da mão de Deus bate contra seu sagrado punho fechado e um imenso 'top top' atroa os espaços e dedos imensos se esticam do céu e nos mandam enfiá-los, deus sabe aonde, e os mortos teimam em morrer e os traficantes de órgãos ficam desolados com o desperdício de corpos. Os vivos não cooperam e as pistas continuam em coma e os aviões fumam maconha e os pilotos aterram aterrados e os taxistas vigiam preocupados os negros céus de São Paulo, os pássaros vivem em pânico e resolvem andar a pé nas estradas esburacadas, com as verbas de recuperação roubadas no Ministério dos Transportes, os cachorros cagam nas pistas, o ministro da Defesa se derrete e escorre para o ralo, duzentos milhões de dólares fogem às gargalhadas dos cofres da Infraero e ninguém faz nada, ninguém investiga e a grana toda voa como chuva de confete sobre a Anac que gruda o rabo do diretor na cadeira para impedir sua demissão, pois ele diz que a competência é irrelevante e que seria covardia sair agora.
Entrementes: o presidente do Senado sob suspeita (lembram como é o nome dele?) exulta com as catástrofes pois, talvez, o olvidem para sempre, esqueçam os envelopes que voavam sozinhos para os bolsos, vindo das empreiteiras, dos açougues onde as carcaças de bois se esquartejavam em notas frias, a Gautama também comemora (como é o nome ?), o Zuleidão mergulha eufórico nos canais de esgoto a céu aberto, enquanto os viadutos interrompidos choram de solidão, as barragens morrem de sede, as lâmpadas do 'luz para todos' mergulham nas trevas, o Roriz roreja sua lama na falta de memória do povo, os intelectuais continuam calados, a USP dorme o sono dos injustos.
Em meio a isso tudo, o Rio São Francisco fervilha de piranhas e se recusa a ser desviado, o bispo exibicionista se empapuça de hóstias consagradas e se prepara para nova greve de fome, a opinião pública abraça lagoas e usa camisetas com a palavra paz, o Pan acaba, os traficantes comemoram o ouro que já vem vindo de novo por aí, nas linhas vermelhas e amarelas, enquanto os narizes de celebridades celebram e fazem surubas, felizes com o pó que vai voltar a chover em Ipanema e nos Jardins, as comissões de inquérito continuam a dizer que a culpa de tudo é do amigo do Homem Aranha, que tudo foi mais uma missão do 'Capitão Falha Humana', com sua caceta sobre o planeta, que tudo é erro dos pilotos, provavelmente pilotos mansos, com dor-de-corno, largados pela mulher, enchendo as caixas-pretas de lamúrias, lágrimas e sambas-canção, o que os fez deslocar manetes e manchos num desatino de ciúmes, empapuçados de Lexotans ou senão dores-de-corno de urubus traído por papagaios sem-vergonha, que cometeram suicídio, enfiando-se loucamente dentro das turbinas invertidas sobre os lixões.
Concomitantemente, os papéis onde o Executivo escreveu o PAC serão usados como papel higiênico no Planalto para poupar dinheiro, de modo a haver verba para contratar mais 600 imbecis para o Professor Pardal Mangabeira erguer o queixinho fascista com sotaque americano, em vez de contratar controladores de vôo novos, tudo isso rolando enquanto Renan não agüenta mais o tal recesso parlamentar, porque a esposa agora está se vingando no recesso do lar, emanando rancor e acusações mudas pelos cantos das fazendas imaginárias, enquanto continua a dúvida se veremos ou não as partes intimas de Mônica (dobrem a oferta, Playboy...), enquanto a dama do charuto da Anac diz que o acidente não foi no ar, ninguém bateu no ar, logo não tem nada a ver com ela.
Finalmente, como não temos mais palavras para exprimir nossa indignação, ou melhor, como não temos mais indignação para exprimir em palavras, ou melhor ou pior ainda, como não há mais nada para exprimir ou espremer, precisamos saber urgentemente se o Olavo vai f... a vida de Fabio Assunção, se Taís vai estrangular a irmã Paula e principalmente questões fundamentais como saber se 'em trilha de paca, tatu caminha dentro, se jacaré no seco anda, se cavalo que galopa na bunda sua...', em suma, as coisas importantes da vida como, por exemplo, se o passaralho vai continuar voando ou se 'passarinho que come pedra sabe o c... que tem'? Será que já sabe?
E fica a certeza de que a única lei que é respeitada no País é a Lei de Murphy e que a única coisa profunda que ouvi ultimamente foi daquele americano expulso: 'Welcome to Congo!' O Congo é aqui mesmo.
por Arnaldo Jabor
As coisas é que têm a culpa de tudo, o piano andou bebendo, 'the piano has been drinking!' cantou Tom Waits, 'my necktie is asleep', minha gravata está dormindo, 'the jukebox is taking a leak', a vitrola foi mijar, o tapete precisa de um corte de cabelo, o afinador de pianos é surdo e eu, cá comigo, continuo: os Boeings e legacies e airbuses andaram enchendo a cara também, enquanto os jornais teimam em nos propagar catástrofes que, no dizer das autoridades, se produziram sozinhas como cogumelos autóctones, enquanto o presidente some sob as vaias do Pan e, magoado, se esconde sob os terçóis do palácio, iluminado pela aura do botox que resplende da primeira-dama muda e as pistas dos aeroportos rolam de porre debaixo de chuva, as turbinas se revoltam, as asas tatalam e se partem, os motores se recusam a rodar e destroncam a língua em palavrões, as medalhas vêm pousar como gafanhotos nos peitos dos canalhas, os pepinos se enfiam no rabo dos brigadeiros, os mortos berram com orgulho que são cadáveres verde-e-amarelo, cem por cento nacionais e os 'groovings' não são 'groovy', as ranhuras viram regos arrombados, os pneus rebolam como gelatina, os trens-de-aterrisagem são aleijados, os radares são morcegos drogados e os controladores são cegos de um olho e não enxergam com o outro.
As petistas eróticas gozam fumando charutos, os puteiros erupem como vulcões de esperma na beira das pistas, no caminho dos 'airbuses', as gargalhadas roncam nas gargantas dos ministros, a palma da mão de Deus bate contra seu sagrado punho fechado e um imenso 'top top' atroa os espaços e dedos imensos se esticam do céu e nos mandam enfiá-los, deus sabe aonde, e os mortos teimam em morrer e os traficantes de órgãos ficam desolados com o desperdício de corpos. Os vivos não cooperam e as pistas continuam em coma e os aviões fumam maconha e os pilotos aterram aterrados e os taxistas vigiam preocupados os negros céus de São Paulo, os pássaros vivem em pânico e resolvem andar a pé nas estradas esburacadas, com as verbas de recuperação roubadas no Ministério dos Transportes, os cachorros cagam nas pistas, o ministro da Defesa se derrete e escorre para o ralo, duzentos milhões de dólares fogem às gargalhadas dos cofres da Infraero e ninguém faz nada, ninguém investiga e a grana toda voa como chuva de confete sobre a Anac que gruda o rabo do diretor na cadeira para impedir sua demissão, pois ele diz que a competência é irrelevante e que seria covardia sair agora.
Entrementes: o presidente do Senado sob suspeita (lembram como é o nome dele?) exulta com as catástrofes pois, talvez, o olvidem para sempre, esqueçam os envelopes que voavam sozinhos para os bolsos, vindo das empreiteiras, dos açougues onde as carcaças de bois se esquartejavam em notas frias, a Gautama também comemora (como é o nome ?), o Zuleidão mergulha eufórico nos canais de esgoto a céu aberto, enquanto os viadutos interrompidos choram de solidão, as barragens morrem de sede, as lâmpadas do 'luz para todos' mergulham nas trevas, o Roriz roreja sua lama na falta de memória do povo, os intelectuais continuam calados, a USP dorme o sono dos injustos.
Em meio a isso tudo, o Rio São Francisco fervilha de piranhas e se recusa a ser desviado, o bispo exibicionista se empapuça de hóstias consagradas e se prepara para nova greve de fome, a opinião pública abraça lagoas e usa camisetas com a palavra paz, o Pan acaba, os traficantes comemoram o ouro que já vem vindo de novo por aí, nas linhas vermelhas e amarelas, enquanto os narizes de celebridades celebram e fazem surubas, felizes com o pó que vai voltar a chover em Ipanema e nos Jardins, as comissões de inquérito continuam a dizer que a culpa de tudo é do amigo do Homem Aranha, que tudo foi mais uma missão do 'Capitão Falha Humana', com sua caceta sobre o planeta, que tudo é erro dos pilotos, provavelmente pilotos mansos, com dor-de-corno, largados pela mulher, enchendo as caixas-pretas de lamúrias, lágrimas e sambas-canção, o que os fez deslocar manetes e manchos num desatino de ciúmes, empapuçados de Lexotans ou senão dores-de-corno de urubus traído por papagaios sem-vergonha, que cometeram suicídio, enfiando-se loucamente dentro das turbinas invertidas sobre os lixões.
Concomitantemente, os papéis onde o Executivo escreveu o PAC serão usados como papel higiênico no Planalto para poupar dinheiro, de modo a haver verba para contratar mais 600 imbecis para o Professor Pardal Mangabeira erguer o queixinho fascista com sotaque americano, em vez de contratar controladores de vôo novos, tudo isso rolando enquanto Renan não agüenta mais o tal recesso parlamentar, porque a esposa agora está se vingando no recesso do lar, emanando rancor e acusações mudas pelos cantos das fazendas imaginárias, enquanto continua a dúvida se veremos ou não as partes intimas de Mônica (dobrem a oferta, Playboy...), enquanto a dama do charuto da Anac diz que o acidente não foi no ar, ninguém bateu no ar, logo não tem nada a ver com ela.
Finalmente, como não temos mais palavras para exprimir nossa indignação, ou melhor, como não temos mais indignação para exprimir em palavras, ou melhor ou pior ainda, como não há mais nada para exprimir ou espremer, precisamos saber urgentemente se o Olavo vai f... a vida de Fabio Assunção, se Taís vai estrangular a irmã Paula e principalmente questões fundamentais como saber se 'em trilha de paca, tatu caminha dentro, se jacaré no seco anda, se cavalo que galopa na bunda sua...', em suma, as coisas importantes da vida como, por exemplo, se o passaralho vai continuar voando ou se 'passarinho que come pedra sabe o c... que tem'? Será que já sabe?
E fica a certeza de que a única lei que é respeitada no País é a Lei de Murphy e que a única coisa profunda que ouvi ultimamente foi daquele americano expulso: 'Welcome to Congo!' O Congo é aqui mesmo.
Arnaldo Jabor, carioca nascido em 1940, é cineasta e jornalista, também já foi técnico de som, crítico de teatro, roteirista e diretor de curtas e longas metragens. Na década de 90, por força das circunstâncias ditadas pelo governo Fernando Collor de Mello, que sucateou a produção cinematográfica nacional, Jabor foi obrigado a procurar novos rumos e encontrou no jornalismo o seu ganha-pão. Estreou como colunista de O Globo no final de 1995 e mais tarde levou para a TV Globo, no Jornal Nacional, no Bom Dia Brasil e na Rádio CBN. O estilo irônico e mordaz com que comenta os fatos da atualidade brasileira foi decisivo para o seu grande sucesso junto ao público. Arnaldo Jabor também é colunista do jornal “O Estado de S. Paulo”, além de escrever regularmente para diversos outros jornais do Brasil.
Publicado no jornal "O Estado de S. Paulo".
Terça-feira, 31 julho de 2007.
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http://bootlead.blogspot.com
PARADOXAL! - Arnaldo Jabor
2 comments:
Olha
fica difícil selecionar o que dizer disso
SON OF A HORN, SERVE?
Bootlead
achei esse comentário no blog da Lucia Hippólito, sobre os puxa-saco
quisera eu ter tido inspiração pra escrever isso antes:
Puxa-saco ou Puxasacus Enrabadus é uma especie de macaco proveniente do PTQUEOSPAREO, habitualmente encontrado no mesmo nicho ecologioco que os chefes vermes da familia dos | filhus d'prostitutas responsaveis por sugar o sangue de qualquer coisa que é viva, os puxa sacos se alimentam de degetos dos chefes e se reprodusem através de enrabamentos. O segredo dessa nobre arte do puxa-saquismo consiste em fazer, ou tentar, o chefe gostar mais de você, f..........do a vida de todo mundo
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