No pasarán!
O censor utópico
por Demétrio Magnoli
As Meninas Superpoderosas não receberão o selo de Programa Especialmente Recomendado para Crianças e Adolescentes. É que Tarcízio Ildefonso, diretor-adjunto do Departamento de Justiça e Classificação Indicativa (Dejus), não aprova a ambientação, em shopping center, da confraternização das heróicas meninas: “Esse gesto é segregacionista, já que nem todos podem fazer compra em shopping, além de ser um estímulo ao consumismo.” Ildefonso gostaria que elas celebrassem suas vitórias “no Palácio da Justiça”. Eu, que não nutro a mesma admiração fetichista pelos templos do Estado, faria as meninas confraternizarem em praça pública. Minhas preferências são irrelevantes. As dele valem ouro: todos os dias, compulsoriamente, ocuparão as telas das redes nacionais de televisão.
Se o Supremo permitir, Ildefonso e seus colegas se tornarão “meninos superpoderosos”. As suas preferências serão convertidas em selos bilionários ou em supressões irremediáveis porque, por meio da classificação horária obrigatória, eles têm os meios de destroçar financeiramente produtos culturais moldados para os anunciantes do horário nobre. Os censores da nova era não cortam cenas ou proíbem filmes: eles põem a mídia eletrônica de joelhos diante do poder de turno.
Na ditadura militar, os chefes da Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP) falavam em nome da moral e dos costumes. Os novos censores renegam seus ancestrais e falam em nome da democracia. Eles acusam os críticos de prestarem serviço às empresas de mídia, como se o princípio do lucro não pudesse conviver harmoniosamente com o da censura. Eles citam Estados democráticos que fazem classificação indicativa, omitindo ritualmente a circunstância decisiva: lá fora, não há exame prévio de programas e quem classifica são órgãos de auto-regulamentação; aqui, o governo passa a dispor do poder discricionário de controle prévio e classificação. O nome disso é censura.
O Dejus não é o DCDP. Aos olhos dos censores orgulhosos de outrora, um beijo era um beijo, sexo era sexo e um crânio partido era o que era. Os censores dissimulados de agora são seres mais complexos. Reverentemente, eles obedecem às regras de um manual parido por “especialistas” que ensina a inserir cada coisa no seu “contexto”. Há beijos virtuosos e beijos ominosos. Existe sexo do bem e pura sacanagem. O tiro e o crânio partido são interpretados à luz dos imperativos de justiça social. O valor de cada gesto, palavra e cena depende de seus significados políticos e culturais.
O Manual de Classificação Indicativa é um anacronismo intelectual digno de regimes como os de Stalin, Salazar ou Mussolini. Enrolando-se no manto dos direitos humanos e prometendo um “diálogo pedagógico com a sociedade”, o documento atualiza a meta fascista e comunista de fabricação do Homem Novo. Numa passagem memorável, ele define “comportamentos repreensíveis” como sendo “contextos/cenas/diálogos que valorizam ou estimulam irresponsabilidade, egoísmo, desonestidade, desrespeito para com os demais, manipulação, preconceito, ameaça, fuga de conflitos - sem que, ao mesmo tempo, haja uma clara mensagem de repúdio a essas práticas”. A bíblia do censor dissimulado propicia, ao sabor do arbítrio do Dejus, a mais vasta latitude de interpretação e interferência sobre produtos culturais. De Shakespeare ao folhetim, tudo pode ser expurgado para a solidão da madrugada. O antigo DCDP pretendia cercear, amordaçar, calar, proibir. O novo Dejus almeja falar, moldar, doutrinar, ensinar.
O Dejus é Lula em toda a sua glória. Há anos, o presidente reitera, em incontáveis pronunciamentos, o paralelo entre a nação e a família. Sob essa lógica, ele se apresenta como pai, que trata o povo, “especialmente os mais pobres”, como seus próprios filhos, exercita a paciência, mas não renuncia à firmeza, traça limites e sofre ao dizer “não”. A metáfora da nação-família, uma pedra angular de autoritarismos de diversas matrizes, é o alicerce ideológico que sustenta o edifício da nova censura.
Lula não inventou a classificação indicativa, um fruto da articulação entre ONGs e intelectuais petistas que pregam o “controle social da mídia”. Mas o ambiente político no qual floresce o dirigismo cultural está contaminado pela idéia de que a missão do Estado é educar a sociedade. Não se pode confiar na auto-regulamentação da mídia, na crítica pública da programação de tevê ou no discernimento das famílias: a consciência nacional deve ser depositada aos cuidados do censor utópico incrustado no Ministério da Justiça.
A visão paternalista acalentada pelo Planalto oferece pretextos para variadas aventuras dirigistas. Meses atrás, os Ministérios da Saúde e da Educação produziram uma cartilha de educação sexual destinada a alunos de escolas públicas de 13 a 19 anos que ensina a colocar preservativo e os convida a relatar suas “ficadas”, expressão na qual se inclui “beijar, namorar e transar”. Posta diante da objeção de que a cartilha circunda a mediação dos professores e ignora a vontade das famílias interessadas em evitar a iniciação sexual precoce dos adolescentes, Mariângela Simões, diretora do Programa DST/Aids e responsável pelo material, retrucou que “o foco é o jovem, não a censura que possa vir de um pai”. O texto da cartilha - com trechos como “sexo não é só penetração. Seduza, beije, cheire, experimente!” - talvez não passasse pelo crivo do Dejus, mas as duas iniciativas compartilham a fé na virtude do Estado e o desprezo pelo livre-arbítrio dos cidadãos.
O ridículo está à solta. Na era da internet de massas, o Ministério da Justiça alega a urgência de proteger as crianças dos perigos da tevê nos horários em que os pais estão ausentes, enquanto admira, indiferente, o espetáculo da humilhação cotidiana dos jovens das favelas pela ação do crime organizado e da polícia corrompida. Há método no absurdo: os doutrinários que ignoram o direito à segurança são os mesmos que usurpam o direito à liberdade.
Demétrio Magnoli é graduado em Ciências Sociais e Doutor em Geografia Humana pela FFLCH-USP, editor da publicação Mundo - Geografia e Política Internacional, assina coluna semanal na Folha de S. Paulo e integra o GACINT - Grupo de Análises de Conjuntura Internacional da USP. Autor e co-autor de vários livros nas áreas de Geografia, Conjuntura Internacional, História Contemporânea, tais quais: " O Que é Geopolítica", "Da Guerra Fria à Detènte" e "O Mundo Contemporâneo", entre outros, além ministrar palestras e colaborar em diversos órgãos da mídia.
Publicado no jornal " O Estado de S. Paulo".
Quinta-feira, 31 de maio de 2007.
por Demétrio Magnoli
As Meninas Superpoderosas não receberão o selo de Programa Especialmente Recomendado para Crianças e Adolescentes. É que Tarcízio Ildefonso, diretor-adjunto do Departamento de Justiça e Classificação Indicativa (Dejus), não aprova a ambientação, em shopping center, da confraternização das heróicas meninas: “Esse gesto é segregacionista, já que nem todos podem fazer compra em shopping, além de ser um estímulo ao consumismo.” Ildefonso gostaria que elas celebrassem suas vitórias “no Palácio da Justiça”. Eu, que não nutro a mesma admiração fetichista pelos templos do Estado, faria as meninas confraternizarem em praça pública. Minhas preferências são irrelevantes. As dele valem ouro: todos os dias, compulsoriamente, ocuparão as telas das redes nacionais de televisão.
Se o Supremo permitir, Ildefonso e seus colegas se tornarão “meninos superpoderosos”. As suas preferências serão convertidas em selos bilionários ou em supressões irremediáveis porque, por meio da classificação horária obrigatória, eles têm os meios de destroçar financeiramente produtos culturais moldados para os anunciantes do horário nobre. Os censores da nova era não cortam cenas ou proíbem filmes: eles põem a mídia eletrônica de joelhos diante do poder de turno.
Na ditadura militar, os chefes da Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP) falavam em nome da moral e dos costumes. Os novos censores renegam seus ancestrais e falam em nome da democracia. Eles acusam os críticos de prestarem serviço às empresas de mídia, como se o princípio do lucro não pudesse conviver harmoniosamente com o da censura. Eles citam Estados democráticos que fazem classificação indicativa, omitindo ritualmente a circunstância decisiva: lá fora, não há exame prévio de programas e quem classifica são órgãos de auto-regulamentação; aqui, o governo passa a dispor do poder discricionário de controle prévio e classificação. O nome disso é censura.
O Dejus não é o DCDP. Aos olhos dos censores orgulhosos de outrora, um beijo era um beijo, sexo era sexo e um crânio partido era o que era. Os censores dissimulados de agora são seres mais complexos. Reverentemente, eles obedecem às regras de um manual parido por “especialistas” que ensina a inserir cada coisa no seu “contexto”. Há beijos virtuosos e beijos ominosos. Existe sexo do bem e pura sacanagem. O tiro e o crânio partido são interpretados à luz dos imperativos de justiça social. O valor de cada gesto, palavra e cena depende de seus significados políticos e culturais.
O Manual de Classificação Indicativa é um anacronismo intelectual digno de regimes como os de Stalin, Salazar ou Mussolini. Enrolando-se no manto dos direitos humanos e prometendo um “diálogo pedagógico com a sociedade”, o documento atualiza a meta fascista e comunista de fabricação do Homem Novo. Numa passagem memorável, ele define “comportamentos repreensíveis” como sendo “contextos/cenas/diálogos que valorizam ou estimulam irresponsabilidade, egoísmo, desonestidade, desrespeito para com os demais, manipulação, preconceito, ameaça, fuga de conflitos - sem que, ao mesmo tempo, haja uma clara mensagem de repúdio a essas práticas”. A bíblia do censor dissimulado propicia, ao sabor do arbítrio do Dejus, a mais vasta latitude de interpretação e interferência sobre produtos culturais. De Shakespeare ao folhetim, tudo pode ser expurgado para a solidão da madrugada. O antigo DCDP pretendia cercear, amordaçar, calar, proibir. O novo Dejus almeja falar, moldar, doutrinar, ensinar.
O Dejus é Lula em toda a sua glória. Há anos, o presidente reitera, em incontáveis pronunciamentos, o paralelo entre a nação e a família. Sob essa lógica, ele se apresenta como pai, que trata o povo, “especialmente os mais pobres”, como seus próprios filhos, exercita a paciência, mas não renuncia à firmeza, traça limites e sofre ao dizer “não”. A metáfora da nação-família, uma pedra angular de autoritarismos de diversas matrizes, é o alicerce ideológico que sustenta o edifício da nova censura.
Lula não inventou a classificação indicativa, um fruto da articulação entre ONGs e intelectuais petistas que pregam o “controle social da mídia”. Mas o ambiente político no qual floresce o dirigismo cultural está contaminado pela idéia de que a missão do Estado é educar a sociedade. Não se pode confiar na auto-regulamentação da mídia, na crítica pública da programação de tevê ou no discernimento das famílias: a consciência nacional deve ser depositada aos cuidados do censor utópico incrustado no Ministério da Justiça.
A visão paternalista acalentada pelo Planalto oferece pretextos para variadas aventuras dirigistas. Meses atrás, os Ministérios da Saúde e da Educação produziram uma cartilha de educação sexual destinada a alunos de escolas públicas de 13 a 19 anos que ensina a colocar preservativo e os convida a relatar suas “ficadas”, expressão na qual se inclui “beijar, namorar e transar”. Posta diante da objeção de que a cartilha circunda a mediação dos professores e ignora a vontade das famílias interessadas em evitar a iniciação sexual precoce dos adolescentes, Mariângela Simões, diretora do Programa DST/Aids e responsável pelo material, retrucou que “o foco é o jovem, não a censura que possa vir de um pai”. O texto da cartilha - com trechos como “sexo não é só penetração. Seduza, beije, cheire, experimente!” - talvez não passasse pelo crivo do Dejus, mas as duas iniciativas compartilham a fé na virtude do Estado e o desprezo pelo livre-arbítrio dos cidadãos.
O ridículo está à solta. Na era da internet de massas, o Ministério da Justiça alega a urgência de proteger as crianças dos perigos da tevê nos horários em que os pais estão ausentes, enquanto admira, indiferente, o espetáculo da humilhação cotidiana dos jovens das favelas pela ação do crime organizado e da polícia corrompida. Há método no absurdo: os doutrinários que ignoram o direito à segurança são os mesmos que usurpam o direito à liberdade.
Demétrio Magnoli é graduado em Ciências Sociais e Doutor em Geografia Humana pela FFLCH-USP, editor da publicação Mundo - Geografia e Política Internacional, assina coluna semanal na Folha de S. Paulo e integra o GACINT - Grupo de Análises de Conjuntura Internacional da USP. Autor e co-autor de vários livros nas áreas de Geografia, Conjuntura Internacional, História Contemporânea, tais quais: " O Que é Geopolítica", "Da Guerra Fria à Detènte" e "O Mundo Contemporâneo", entre outros, além ministrar palestras e colaborar em diversos órgãos da mídia.
Publicado no jornal " O Estado de S. Paulo".
Quinta-feira, 31 de maio de 2007.
http://bootlead.blogspot.com
Raça repugnante
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O socialismo na pratica do comunismo.
Por Ricardo Antonio Filgueiras.
Grande evolução das Américas no contesto planetário envolvendo os povos democráticos que se formaram neste milênio e hoje é vestida na pobreza crescida pela política econômica selvagem que veio sendo construída através dos alicerces com os pilares da sociedade organizada mundial, agora estão se deparando com um novo processo que vem esticando pelos poderes dados aos governastes neste mundo.
Se pararmos para analisar as grandes incorporações em seus crescimentos de poder econômico embutido por empresariados de maiores empresas tomados de ensartados pela grande vaidade e de poder, vieram ao tempo financiando partidos em todo o mundo principalmente nos paises democráticos, os políticos subiam ao poder e muitos passavam para o lado da ganância e da vaidade financiada por estas incorporações, hoje a sociedade esta totalmente atrelada a esta política e se vê que nada pode ser feito para mudar há não ser através de uma revolução intelectual mais este caminho não foi preparado pelos que vieram governando as políticas que sempre foram de disputas econômicas e não sociais.
Pois bem o esmagamento social é visto em todo o planeta a pobreza que se a lastrou de forma incontrolável a economia mundial esta na mão de poucos e nada mais pode ser feito sendo assim através dos gritos humanos e dos apelos mundiais que vem aos poucos se formando uma grandiosa onda de poder sobre o poder do controle humano planetário e este poder fará grande concentração ainda maior de riquezas já vista em toda a estória do mundo e esta sendo implantada através de medidas políticas mentirosas que é apregoada pelo comunismo que não pode se alastrar a traves dos tempos que foram combatidas por muitos democratas.
Homens democráticos vieram combatendo a praga do comunismo em alguns paises e trouxeram a política do capitalismo para as necessidades da evolução humana em todos os aspectos necessários ao bem estar dos povos, homens públicos de hoje através dos seus pais onde muitos se esforçaram para o crescimento do trabalho e seu desenvolvimento mais o deixaram desprovido o capitalismo, os democratas não atrelaram medidas necessárias para o desenvolvimento do capitalismo social e não aperfeiçoaram as leis para melhorar a democracia dividindo o bolo e suas fatias nas camadas sócias menos favorecidas e assim o povo teria o melhor acesso ao desenvolvimento e as empresas no seu crescimento sustentável da harmonia capitalista onde o capital seria controlado através de leis que não destruísse o que veio construindo no decorrer da evolução. Hoje nós cidadãos atravessamos uma espécie de vandalismo financeiro e intelectual que envolve todos no caminho do esmagamento social em que vivemos.
Este capitalismo sem a regra que esmaga e nos tira o social formado por muitas camadas desprovidas no intelectual, deixou as brechas para o controle do comunismo e o seu disfarce com palavras e pensamento antes democráticos que são empregados por governantes vendidos pelo poder se dizendo social, este poder esta crescendo em todo o mundo e agora pode se ver os continentes americanos caminhando a passos largos da destruição democrática, falam em bondades sociais para o povo e assim vão se apoderando cruelmente das incorporações empresariais quando elas despertam e combatem no seu direito constituído da democracia e a sociedade nada pode fazer por ela estar partilhada na pobreza que muito tempo vieram assolando na vida da maioria das famílias no mundo e assim ficou desprovidas nas condições intelectuais e materiais que contraíram pela política gananciosa da riqueza produzida pela sociedade organizada que a mesma sociedade ela vem se desorganizando pela própria dor.!
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