O banquete de migalhas de Sarney e Temer
por José Nêumanne
O PMDB está em festa: três meses depois de ter comemorado um amplo triunfo nas eleições municipais de outubro de 2008, entra em 2009 refestelado nas presidências da Câmara e do Senado. Ou seja, fez barba, cabelo e bigode! Como 11 entre 10 comentaristas políticos em atividade na imprensa, no rádio e na televisão consideram que os pleitos municipais de 2008 foram o vestíbulo e da composição das Mesas dirigentes das duas Casas do Congresso Nacional se tece o capacho (nunca antes uma palavra foi tão bem usada em todos os sentidos, modéstia inclusa) da eleição de 2010, enfim, estará o partido da resistência civil à ditadura militar pronto para assumir o poder na República, do qual foi apeado pela vontade do povo desde que José Sarney saiu do Palácio do Planalto. Mas esta será uma afirmação tão autêntica quanto a natureza peemedebista do "novelho" presidente do Senado.
O caso é que o PMDB não ganhou as eleições municipais. A aritmética de sua vitória renega aquele princípio matemático segundo o qual não é correto somar laranjas com bananas, pelo fato elementar de que, ao serem somadas, laranjas não passam a ter gosto de banana e vice-versa. Não se pode falar em vitória nacional de um partido num pleito municipal, seja na Suíça ou no Paraguai. Quanto mais num país do tamanhão do nosso! Mesmo tendo vencido a eleição no segundo maior município do País, São Sebastião do Rio de Janeiro, com um candidato tão puro-sangue quanto o maranhense do Amapá, o ex-tucano Eduardo Paes, e ainda que faça parte da coligação vencedora no maior de todos, São Paulo de Piratininga, desde os primórdios da disputa, nada há a ser comemorado pelo PMDB. Ou melhor: há, sim! Composto por gatos e sapatos que não se entendem nem se toleram, o PMDB tem mais é de cantar vitória para valorizar o próprio peixe. Os outros dirigentes políticos que tratem de separar a verdade da falsidade para não comprarem gato por lebre. Nós outros, que não temos cargos a distribuir nas províncias nem na capital, é que nada temos a ganhar numa festa em que o penetra se comporta como anfitrião e este se finge de morto só para dele tirar o pior.
O domínio do Poder Legislativo pelo maior aliado do governo, seja qual for o governo, não diz respeito à cidadania, tampouco à disputa decisiva que se dará em 2010, quando forem disputados os governos estaduais e a maior joia da coroa, a Presidência. Aí, o PMDB ganhará o prêmio que merece no cenário político nacional: o Oscar de coadjuvante de qualquer vencedor de uma eleição de verdade. Ora, dirão os "idiotas da objetividade", Itamar Franco militou no PMDB e foi presidente da República. Sim, mas a situação atual não pode ser comparada com a da Nova República, quando Sarney reinava no Planalto e o dr. Ulysses dava as cartas na Praça dos Três Poderes. Como Sarney, saído da cúpula do partido que servia à ditadura, a Arena, para ser vice de Tancredo, que voltara ao PMDB após haver fundado o PP com o arqui-inimigo Magalhães Pinto, Itamar era vice - do ressurreto Collor - e, portanto, desembarcou na Presidência sem um mísero votinho que sequer aquecesse o chá das 5 das velhinhas inglesas. Agora mandando de novo no Congresso e sem candidato à Presidência, o PMDB se manterá mordomo, mas tão cedo não vai ser castelão.
A vitória de Sarney no Senado e de Michel Temer (SP) na Câmara só confirma a velha vocação que o Parlamento tem no Brasil de bem servir aos senhores do Poder Executivo. Assim foi sempre, à exceção da chamada Nova República, quando o multipresidente do partido, da Constituinte e da Câmara amarrou seu cavalo no mastro da bandeira e deixou ao noviço maranhense as pompas e circunstâncias dos toques de corneta no Alvorada. Em nossa meia-democracia das urnas, o poder popular expresso pelo voto, legítima manifestação de soberania, é atenuado, ou melhor, moderado, como já se dizia no Segundo Império, pelo método de representação escolhido.
O voto proporcional para a Câmara dos Deputados, na qual em teoria o poder popular seria exercido por representação, evita cuidadosamente a interferência do cidadão incômodo. O truque para escamotear a possibilidade de intromissão do populacho nas decisões tomadas pelas elites dirigentes da burguesia patronal, da casta sindical e das cúpulas partidárias também é facilitado pela forma como funciona o Senado Federal. A igualdade aritmética das bancadas de Estados díspares em tamanho, população e importância econômica ajuda a diluir o poder popular num caldo grosso e insípido de interesses paroquiais e ambições classistas. Sarney e Temer passam a ser os encarregados de mexer essa poção.
Isto pode ser muito bom para eles e para os cupinchas que dividirão com ambos as mordomias deste poder de fancaria. Mas nada significa nem para o poder real, que será disputado daqui a dois anos, nem para a cidadania, que se manifestará nas urnas e, depois, se recolherá ao silêncio, "bestializada", como definiu o historiador José Murilo de Carvalho, até a eleição seguinte, em 2014. Em 2010, e depois de quatro em quatro anos, a cidadania escolherá seu chefe e este terá entre seus poderes os instrumentos de cooptação dos parlamentares que, na mesma ocasião, a mesma cidadania escolher. É melhor que o arbítrio das ditaduras civis e militares de antanho. Pode até ser melhor que as farsas passadas do Império moderado ou das eleições de bico de pena da República Velha. Ninguém duvida. Mas é algo bem diferente de uma democracia de verdade, com instituições impessoais, Poderes autônomos, recall e transparência na gestão e, sobretudo, na manipulação dos bens públicos.
O PMDB tem o direito de festejar as migalhas no banquete dos poderosos de verdade. Nós, não! Ainda temos um imenso deserto de homens e ideias a percorrer.
O caso é que o PMDB não ganhou as eleições municipais. A aritmética de sua vitória renega aquele princípio matemático segundo o qual não é correto somar laranjas com bananas, pelo fato elementar de que, ao serem somadas, laranjas não passam a ter gosto de banana e vice-versa. Não se pode falar em vitória nacional de um partido num pleito municipal, seja na Suíça ou no Paraguai. Quanto mais num país do tamanhão do nosso! Mesmo tendo vencido a eleição no segundo maior município do País, São Sebastião do Rio de Janeiro, com um candidato tão puro-sangue quanto o maranhense do Amapá, o ex-tucano Eduardo Paes, e ainda que faça parte da coligação vencedora no maior de todos, São Paulo de Piratininga, desde os primórdios da disputa, nada há a ser comemorado pelo PMDB. Ou melhor: há, sim! Composto por gatos e sapatos que não se entendem nem se toleram, o PMDB tem mais é de cantar vitória para valorizar o próprio peixe. Os outros dirigentes políticos que tratem de separar a verdade da falsidade para não comprarem gato por lebre. Nós outros, que não temos cargos a distribuir nas províncias nem na capital, é que nada temos a ganhar numa festa em que o penetra se comporta como anfitrião e este se finge de morto só para dele tirar o pior.
O domínio do Poder Legislativo pelo maior aliado do governo, seja qual for o governo, não diz respeito à cidadania, tampouco à disputa decisiva que se dará em 2010, quando forem disputados os governos estaduais e a maior joia da coroa, a Presidência. Aí, o PMDB ganhará o prêmio que merece no cenário político nacional: o Oscar de coadjuvante de qualquer vencedor de uma eleição de verdade. Ora, dirão os "idiotas da objetividade", Itamar Franco militou no PMDB e foi presidente da República. Sim, mas a situação atual não pode ser comparada com a da Nova República, quando Sarney reinava no Planalto e o dr. Ulysses dava as cartas na Praça dos Três Poderes. Como Sarney, saído da cúpula do partido que servia à ditadura, a Arena, para ser vice de Tancredo, que voltara ao PMDB após haver fundado o PP com o arqui-inimigo Magalhães Pinto, Itamar era vice - do ressurreto Collor - e, portanto, desembarcou na Presidência sem um mísero votinho que sequer aquecesse o chá das 5 das velhinhas inglesas. Agora mandando de novo no Congresso e sem candidato à Presidência, o PMDB se manterá mordomo, mas tão cedo não vai ser castelão.
A vitória de Sarney no Senado e de Michel Temer (SP) na Câmara só confirma a velha vocação que o Parlamento tem no Brasil de bem servir aos senhores do Poder Executivo. Assim foi sempre, à exceção da chamada Nova República, quando o multipresidente do partido, da Constituinte e da Câmara amarrou seu cavalo no mastro da bandeira e deixou ao noviço maranhense as pompas e circunstâncias dos toques de corneta no Alvorada. Em nossa meia-democracia das urnas, o poder popular expresso pelo voto, legítima manifestação de soberania, é atenuado, ou melhor, moderado, como já se dizia no Segundo Império, pelo método de representação escolhido.
O voto proporcional para a Câmara dos Deputados, na qual em teoria o poder popular seria exercido por representação, evita cuidadosamente a interferência do cidadão incômodo. O truque para escamotear a possibilidade de intromissão do populacho nas decisões tomadas pelas elites dirigentes da burguesia patronal, da casta sindical e das cúpulas partidárias também é facilitado pela forma como funciona o Senado Federal. A igualdade aritmética das bancadas de Estados díspares em tamanho, população e importância econômica ajuda a diluir o poder popular num caldo grosso e insípido de interesses paroquiais e ambições classistas. Sarney e Temer passam a ser os encarregados de mexer essa poção.
Isto pode ser muito bom para eles e para os cupinchas que dividirão com ambos as mordomias deste poder de fancaria. Mas nada significa nem para o poder real, que será disputado daqui a dois anos, nem para a cidadania, que se manifestará nas urnas e, depois, se recolherá ao silêncio, "bestializada", como definiu o historiador José Murilo de Carvalho, até a eleição seguinte, em 2014. Em 2010, e depois de quatro em quatro anos, a cidadania escolherá seu chefe e este terá entre seus poderes os instrumentos de cooptação dos parlamentares que, na mesma ocasião, a mesma cidadania escolher. É melhor que o arbítrio das ditaduras civis e militares de antanho. Pode até ser melhor que as farsas passadas do Império moderado ou das eleições de bico de pena da República Velha. Ninguém duvida. Mas é algo bem diferente de uma democracia de verdade, com instituições impessoais, Poderes autônomos, recall e transparência na gestão e, sobretudo, na manipulação dos bens públicos.
O PMDB tem o direito de festejar as migalhas no banquete dos poderosos de verdade. Nós, não! Ainda temos um imenso deserto de homens e ideias a percorrer.
José Nêumanne Pinto é um escritor, jornalista e poeta, nascido em Uiraúna (PB), em 18 de maio de 1951. Começou sua carreira jornalística no "Diário da Borborema", Campina Grande (PB), como repórter em 1968. Recebeu os prêmios Esso de Jornalismo Econômico em 1975, pela série "Perfil do Operário Brasileiro Hoje" e o Troféu Imprensa de Reportagem Esportiva, também em 1975, pela reportagem "Éder Jofre e o Boxe Brasileiro". Nêumanne foi colunista, com um artigo semanal sobre Brasil na edição em castelhano do jornal "Miami Herald" . Atualmente reside em São Paulo, onde é articulista periódico do jornal "O Estado de S. Paulo" e editorialista do "Jornal da Tarde", além de publicar seus artigos em diversos órgãos da imprensa nacional. Como escritor José Nêumanne tem diversos livros publicados, também é editor do blog "Estação José Nêumanne" sobre poesia, jornalismo e literatura. E-mail: neuman@estado.com.br
Publicado no jornal "O Estado de S.Paulo" – (Editorial Opinião).
Quarta-feira, 04 de fevereiro de 2009.
Leia também: Não é fácil ser Obama – João Mellão Neto
http://bootlead.blogspot.com
O caráter de um povo, deve ser julgado pelo tipo de pessoas que elege.
4 comments:
A nós, pobres mortais, só resta chorar e bater na cabeça, dizendo: de fato, o povo tem aquilo que merece.
Da minha parte, procuro ensinar meus filhos ( e os que me rodeiam) a pensar, a questionar. Nossa geração está perdida, quem sabe a gente ensina a próxima a ser cidadã de verdade?
Mas estou viva e de olho no que acontece por aqui. embora me sinta humihada e amarrada. Somos marionetes.
Boa quinta.
Sim, Boot, com certeza o caráter de um povo se mede pela afinidade de seus sonhos, desejos e tambem pelos representantes que elege. Mas há que se considerar em nosso caso, outro dado igualmente alarmante que tambem nos remete ao exame de consciência como povo e como Nação: a fraude! Desde que abandonou-se o escrutínio manual, ninguém e nem partido algum ousaram verificar a lisura do pleito. Tão pouco importam-se se as urnas eletrônicas são seguras ou não. Se emitem algum tipo de comprovante do voto impresso ou não. Isso é falta de virtude. E povo que não tem virtude, um dia acaba por ser escravo, infelizmente. Pra terminar, nessa última eleição para prefeito, eu anulei o voto. E quando você digita um valor que o sistema identifica como nulo, o sinal eletrônico que a urna emite é diferente quando você faz tudo certinho, ou seja, vota em alguém. Todos os mesários me olharam com cara feia...rs...
Isso tudo é um tremendo "acerto" que permitirá a reeleição indefinida de Lula sem nenhuma oposição....
E, para piorar as coisas, breve teremos no "panorama democrático tupiniquim", novos partidos: PCC, CV, MST, MSTU, LCP....e viva a Democracia botocuda!
Olá, criamos uma marca para identificar os blogs que fazem oposição ao DESgoverno da PTralhada, e seu Blog foi indicado pelo Paschoal O Copista para participar e formar um grupo bem barulhento de gente que ainda tem a capacidade de indignação e não aceita esses desmandos da corja que tomou de assalto o Brasil.
Caso você tenha interesse em aderir é só ir na página de
O-Mascate
http://o-mascate.blogspot.com/ e copiar a imagem do "BLOGS DA REISTêNCIA"
e colar na sua página. E passar adiante essa idéia para outros blogueiros que também são como nós.
Em grupo certamente incomodaremos muito mais.
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