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Sunday, August 10, 2008

"BLOOD COCAINE"





Tráfico monta nas matas cursos para jovens integrantes de quadrilhas aprenderem técnicas de guerrilha e uso de armas
por Sérgio Ramalho e Vera Araújo para "O Globo"

O tráfico no Rio está investindo em jovens sem perspectivas de trabalho nas favelas para treinar, em áreas de Mata Atlântica, verdadeiros guerrilheiros.

A informação de que traficantes estão montando esse tipo de curso é citada em relatório da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e foi obtida também pelos analistas da Coordenação de Segurança e Inteligência (CSINT), do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase).

O documento da Abin foi elaborado com base em dados dos setores de inteligência das polícias Civil e Militar, que constataram o emprego desse tipo de tática em confrontos na mata na Rocinha, no Vidigal e nos morros do Chapéu Mangueira e da Babilônia (ambos no Leme).

Na Zona Sul, a principal facção a usar esse tipo de treinamento tem como principal reduto as favelas do PavãoPavãozinho (Copacabana) e do Cantagalo (Ipanema). De acordo com o relatório da agência, os instrutores são jovens das comunidades que passaram pelas Forças Armadas ou ainda estão prestando serviço militar. Agentes da CSINT descobriram que há casos de alunos de até 11 anos.

— Numa sociedade em que ser cidadão é poder consumir, ganhar R$ 1.500 por semana para trabalhar no tráfico de drogas vira, infelizmente, o principal atrativo para essa juventude.

Ninguém quer receber R$ 415 (salário mínimo nacional) — disse o coordenador da CSINT, major da PM Alexandre Azevedo, que prepara um relatório a ser entregue à Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Segurança.

A proposta do diretor-geral do Degase, Eduardo Gameleiro, é a de usar as informações para melhorar o atendimento nas unidades do órgão, responsável pela aplicação de medidas socioeducativas a crianças e adolescentes infratores.

— Temos que usar esses dados para o bem-estar dessas crianças e adolescentes.

O sentido da inteligência no Degase é pedagógico. Temos que criar programas para atendê-los melhor, a partir da realidade que eles vivem em suas comunidades.

Tráfico paga para jovens se alistarem

Segundo o documento da Abin, como incentivo, traficantes oferecem a jovens R$ 300 semanais para que ingressem no Exército ou na Marinha e, de preferência, se tornem pará-quedistas ou fuzileiros navais. Os mais aptos são alçados à posição de instrutores e passam técnicas de guerrilha, tiro e manutenção de armas aos mais novos das quadrilhas. O relatório acrescenta que esses jovens não se limitam a dar treinamento nas favelas de origem. Os mais capacitados dão aulas em comunidades aliadas e até elaboram planos de invasão em áreas dominadas por bandos rivais.

O documento da Abin também cita as rotineiras apreensões de material militar — armas, munição, roupas e barracas de acampamento — em trechos de mata em favelas como Dona Marta, em Botafogo. Dá informações ainda sobre a descoberta de manuais militares e cartilhas com táticas de guerrilha. Em 2002, O GLOBO revelou que, recém-saídos da caserna, ex-soldados e ex-cabos da Brigada PáraQuedista do Exército (PQDs) treinavam traficantes em troca de até R$ 3 mil por aula ou R$ 8 mil por mês.

Traficantes da Rocinha também recebem instruções desse tipo e, segundo a Abin, vêm usando acampamentos na mata no alto da favela para esconder armas, drogas e munição. O relatório da agência frisa que o uso da estratégia vem crescendo como forma de evitar perdas de armas e drogas.

Integrantes da facção que controla a venda de drogas na Rocinha já usaram trilhas no trecho de Mata Atlântica para surpreender rivais no Morro do Vidigal. Segundo o relatório da Abin, os bandidos teriam colocado armadilhas, semelhantes às usadas por caçadores, em trilhas ligando as duas favelas. O objetivo: evitar que os caminhos fossem usados por bandos rivais e integrantes de unidades de elite das polícias Militar e Civil.

O titular da Coordenadoria de Recursos Especiais, delegado Rodrigo Oliveira, reconhece que o treinamento de jovens está se aprimorando: — Quanto menos discernimento, maior o potencial para produzir o mal. Eles acabam fazendo o que o tráfico manda para subir na hierarquia.

As primeiras informações sobre esse treinamento surgiram em 2005, quando um órgão de inteligência do estado interceptou uma conversa entre dois traficantes marcando cursos para "gerente" do tráfico (no Vidigal) e para segurança de quadrilha (em Vigário Geral). Segundo uma fonte da polícia, acostumada a fazer operações na mata, os jovens cada vez mais usam técnicas de guerrilha: — O pior disso tudo é que, para eles, não existe código de guerra. É violência crua. Usam pessoas como escudos e detonam explosivos de forma indiscriminada.

Um dos objetivos é ensinar a montar e gerenciar boca-de-fumo

Aulas incluem ainda lições sobre como atravessar valões, se esconder na mata e suportar torturas
Não importa a compleição física ou o sexo. O que conta é a capacidade de iniciativa, a competitividade e a vontade de montar sua própria "empresa" (boca-de-fumo). Longe de serem regras de empreendedorismo ou gestão de negócios, essas são as qualidades exigidas de quem pretende fazer o curso de treinamento para gerência e segurança do tráfico adotado em pelo menos oito favelas do Rio.

Com duração de seis a 12 meses, o curso é ministrado, geralmente, por ex-integrantes de tropas de elite das Forças Armadas, como expáraquedistas e ex-fuzileiros navais. A faixa etária das turmas, que devem ter até 14 integrantes, começa a partir de 11 anos.

Dois adolescentes que fizeram o curso em favelas de duas facções criminosas contaram ao GLOBO que, para se habilitar, passaram pelos estágios de fogueteiros (responsáveis por soltar fogos para alertar para a chegada da polícia), "aviões" (transportadores de drogas), cargueiros (levam para a favela as drogas encomendadas) e "vapores" (encarregados de vender drogas). Os dois afirmam que não foram aliciados pelo tráfico, e sim que atuar no crime era o único trabalho disponível na comunidade onde moravam.

— Ninguém me ofereceu nada. Eu fui porque quis. Fui fogueteiro, "vapor" e virei cargueiro.

Também trabalhei de "avião". Por último, depois da "graduação" (curso), fui ser gerente — disse K., um dos alunos.

Ao contrário do que se possa imaginar, não é subir um morro com um fuzil AR-15 — que pesa quatro quilos sem o carregador — a parte mais difícil do curso. São as sessões de tortura psicológica e as aulas de esconderijo, em valões fétidos, as partes mais complicadas.

— Perguntaram se eu queria ficar 12 meses no mato. Pensei: não adiantava nada estar ali (na favela) e não saber atirar, usar uma arma. Era um bom treinamento. Não podia estar despreparado.

Formaram uma turma, mas ninguém era obrigado.

Agora, quem aceitasse ir para o mato não podia voltar atrás. Ele (o instrutor) sabia que todo mundo ia correr quando começasse o treinamento.

A partir do momento em que se aceita, não dá para correr — diz K., franzino, de aproximadamente 1,50 metro e 45 quilos.

O jovem passa por pelo menos oito estágios: atravessar valões, aprender a se esconder na mata ou na favela, controlar a mente para não sucumbir às sessões de tortura, progredir nos morros, usar facas, manusear da pistola ao fuzil, montar armadilhas na mata e, por último, gerenciar um ponto de drogas.

— A primeira tarefa era nadar no valão. Foi o pior. Era podre. A gente só segura na arma depois de sete meses. É o que mais a gente quer.

Eles davam o tom. Na última parte, nos ensinaram a montar a nossa própria boca. Era como montar uma empresa. Poucos conseguiram passar. Eu consegui — conta K.

Para Y, o pior mesmo foi o terror psicológico: — Era como brincar de polícia e bandido. A gente ficava numa casa sem nada, um tempão longe da família. Soltavam a gente de noite para os "alemães" (PMs) arregados (pagos pelo tráfico) pegarem a gente. Era para saber quem dava mole, vacilava. Era tudo armado, pois depois eles nos soltavam, mas a gente não sabia. Era só "esculacho" (humilhação), quando nos pegavam.

Y. lembra que os instrutores repetiam o tempo todo que eles não iam sobreviver: — Eles diziam que queriam criar bichos.

Poucos chegaram ao final.


Reportagem de Sérgio Ramalho e Vera Araújo

Publicado no jornal "O Globo".
Domingo, 10 de agosto de 2008.




Palestra no Clube Militar – Fenix






Tuesday, March 25, 2008

"AMAZÔNIA BRASILEIRA": UMA PIADA GROSSEIRA E OBSCENA!

Foto: Sempre o "mar vermelho", vermelho é cor de sangue, muito sugestivo...





































Caros amigos,

Aproveitando a matéria de ISTOÉ no "post" abaixo, faço algumas ponderações sobre o seminário a ser realizado nos dias 26 (amanhã), 27 e 28 de março do corrente, na cidade do Rio de Janeiro (logo, logo "The Dengue's City"), mais precisamente nas instalações do Clube de Aeronáutica, cujo tema é "AMAZÔNIA, COBIÇADA E AMEAÇADA!", sob o patrocínio das seguintes entidades: CEBRES – Centro Brasileiro de Estudos Estratégicos, Clube Naval, Clube Militar e Clube de Aeronáutica.

Sendo que no primeiro dia (26) os conferencistas são militares da mais alta qualidade, destacando-se entre eles os Gen Ex Maynard de Santa Rosa, atualmente Chefe do DGP/EB e profundo conhecedor do assunto a ser debatido e que discorrerá sobre "A evolução geopolítica da Amazônia brasileira", o Gen Bda Durval Antunes Machado Pereira de Andrade Nery, Coordenador de estudos e pesquisa do CEBRES e Conselheiro do Clube Militar, cujo tema é "A Amazônia cobiçada e ameaçada na guerra de quarta geração" e o Cel Gelio Augusto Barbosa Fregapani, que aborda o tópico "A fronteira norte e as ameaças à soberania brasileira". Pronto! Aqui acabou meu interesse no referido seminário, mesmo ainda contando com a presença de outros militares merecedores da minha mais elevada consideração.

E o resto, digamos dos "expositores", alguns não conheço seus currículos e nada posso exprimir, mas outros, valha-me Deus. O que tem para "dizer" sobre a Amazônia aquele anedótico personagem que costuma se fantasiar conforme a "festa", desta feita como o evento realizará-se no Clube de Aeronáutica, provavelmente irá vestido de Brigadeiro-do-Ar, porém quem sabe não será de aviador – piloto de caças supersônicos, aconselho a indumentária completa inclusive com a máscara de oxigênio, só que com o tanque de suprimento "empty". Parece brincadeira, mas um sujeito que na Amazônia só foi fazer turismo, segurar na "sucurujuba", brincar com oncinha e fazer "boquete" em embaúba, seja ouvido em tal seminário.

Tem mais: Reinhold Stephanes, quem é, hem? Mozarildo Cavalcanti, Kátia Regina de Abreu e outros menos cotados. Só blablablá. Faltou convidarem o "Goiabeira" Unger (irmão da terrorista já devidamente recompensada) e a mãe do PAC (Programa de Aceleração da Corrupção) a miss "PACderme", aí sim o time estaria completo. Mesmo que no Rio estivesse, não perderia meu precioso tempo, jamais em tempo algum, para ouvir qualquer coisa que essa malta possa vir a vomitar.

Todavia meus amigos, nem tudo está perdido no dia 31 próximo, além de comemorarmos a data mais importante do Século XX para a nossa Pátria, teremos lá no auditório do Comando Militar do Leste (Palácio Duque de Caxias), às 10:00 horas, uma palestra do autor, escritor e comentarista político Heitor De Paola, que dissertará sobre sua experiência como militante da AP (Ação Popular), intitulada "Minha experiência na esquerda e o significado da Contra-Revolução de 1964", esta palestra vale a pena, farei o possível para comparecer.

Bootlead



O Brasil tem guerrilha
por Alan Rodrigues

O barulho de dois tiros de revólver quebrou o silêncio da noite na pacata comunidade rural de Jacilândia, distante 38 quilômetros da cidade de Buritis, Estado de Rondônia. Passava pouco das 22 horas do dia 22 de fevereiro quando três homens encapuzados bloquearam a estrada de terra que liga o lugarejo ao município e friamente executaram à queima-roupa o agricultor Paulo Roberto Garcia. Aos 28 anos, ele tombou com os disparos de revólver calibre 38 na nuca. Dez horas depois do crime, o corpo de Garcia ainda permanecia no local, estirado nos braços de sua mãe, Maria Tereza de Jesus, à espera da polícia. Era o caçula de seus três filhos. Um mês depois do assassinato, o delegado da Polícia Civil de Rondônia que investiga o caso, Iramar Gonçalves, concluiu: "Ele foi assassinado pelos guerrilheiros da LCP."

A sigla a que o delegado se refere, com estranha naturalidade, quer dizer Liga dos Camponeses Pobres, uma organização radical de extrema esquerda que adotou a luta armada como estratégia para chegar ao poder no País através da "violência revolucionária". Paulo Roberto foi a mais recente vítima da LCP, que, sob a omissão das autoridades federais e o silêncio do resto do Brasil, se instalou há oito anos na região e, a cada hora, se mostra mais violenta. Apenas em 2007, as operações do grupo produziram 22 vítimas - 18 camponeses ou fazendeiros e quatro guerrilheiros. Amplamente conhecidos em Rondônia, os integrantes da LCP controlam hoje 500 mil hectares. Estão repartidos em 13 bases que se estendem de Jaru, no centro do Estado, às cercanias da capital Porto Velho, se alongando até a fronteira com a Bolívia, região onde eles acabaram de abrir uma estrada. O propósito dos guerrilheiros seria usá-la como rota de fuga, mas, enquanto não são incomodados nem pela Polícia Federal nem pelo Exército, a trilha clandestina está sendo chamada de transcocaineira - por ela, segundo a polícia local, passam drogas, contrabando e as armas da guerrilha.

ÁREA PROIBIDA

A nenhuma dessas colônias o poder público tem acesso. Sob o manto da "revolução agrária", a LCP empunha as bandeiras do combate à burguesia, ao imperialismo e ao latifúndio, enquanto seus militantes assaltam, torturam, matam e aterrorizam cidades e zonas rurais nessas profundezas do Brasil. Encapuzados, armados com metralhadoras, pistolas, granadas e fuzis AR-15, FAL e AK-47 de uso exclusivo das Forças Armadas, eles já somam quase nove vezes mais combatentes que os 60 militantes do PCdoB que se embrenharam na Floresta Amazônica no início dos anos 70 na lendária Guerrilha do Araguaia. "A Colômbia é aqui", diz o delegado Gonçalves, numa referência às Farc.

A reportagem de ISTOÉ entrou nessa área proibida. No distrito de Jacinópolis, a 450 quilômetros de Porto Velho, bate o coração da guerrilha. Segundo o serviço secreto da Polícia Militar de Rondônia, é ali que está o campo de treinamento. "Nem com 50 homens armados eu tenho coragem de entrar na invasão deles", admite o delegado. Caminhar pelas hostis estradas enlameadas é como pisar em solo minado. A todo momento e com qualquer pessoa que se converse, o medo de uma emboscada é constante. Os militantes adotam as táticas de bloqueio de estradas e seqüestro das pessoas que trafegam pela área sem um salvo-conduto verbal liberado pela LCP. "É a forma de combater as forças inimigas", escreveram eles num dos panfletos que distribuíram na região. "Esses bandoleiros foram muito bem treinados pelos guerrilheiros das Farc", revela o major Enedy Dias de Araújo, ex-comandante da Polícia Militar de Jaru, cidade onde fica a sede da Liga.

Para se chegar à chamada "revolução agrária", dizem os documentos da LCP aos quais ISTOÉ teve acesso, a principal ação do grupo é pôr em prática a chamada "violência revolucionária". E, para os habitantes locais, essa tem sido uma violência fria e vingativa. No caso da sua mais recente vítima, o que a LCP fez foi uma execução sumária, após um julgamento interno suscitado pela desconfiança sobre o real propósito da presença de Paulo Roberto Garcia na região. "Eles acreditam que o rapaz era um agente infiltrado como agricultor e não tiveram dúvida em matálo", disse o delegado. Dos 22 mortos de 2007, quatro eram fazendeiros e 14 eram funcionários das fazendas, que a liga camponesa classifica como paramilitares. Na parte dos guerrilheiros, quatro foram enterrados - assassinados em circunstâncias distintas por jagunços das fazendas da região.

Além de matar, a LCP é acusada pela polícia de incendiar casas, queimar máquinas e equipamentos e devastar a Floresta Amazônica. Os moradores da comunidade onde vivia Garcia não sabem o que é luta de classe, partido revolucionário e muito menos socialismo. Mas eles sabem muito bem que, desde a chegada da LCP naquelas bandas, a morte matada está vencendo a morte morrida.

ALERTA NA SELVA

Só quem consegue transitar livremente no território da guerrilha são os caminhões dos madeireiros clandestinos, que pagam um pedágio de R$ 2 mil por dia à LCP para rodar nas estradas de terras controladas pela milícia. Em troca do pedágio, os guerrilheiros dão segurança armada aos madeireiros para que eles possam roubar árvores em propriedades privadas, áreas de conservação e terras indígenas. São terras que a LCP diz ter "tomado" - e o verbo tomar, no lugar de "invadir" ou "ocupar", como prefere o MST, não é mera semântica, mas uma revelação do caráter belicoso do grupo. "A falha é do Exército brasileiro, que deixa esses terroristas ocuparem nossa área de fronteira", acusa o major Josenildo Jacinto do Nascimento. Comandante do Batalhão de Polícia Militar Ambiental, Nascimento sente na pele o poder e a arrogância desse bando armado.

No ano passado, eles derrubaram uma base militar da Polícia Ambiental dentro de uma unidade de conservação e seqüestraram seus soldados. "A tática utilizada pela LCP para as emboscadas é certeira", admite um dos militares, mantido preso por sete horas. "Como são estradas de terras, no meio da floresta, eles derrubam árvores, que fecham o caminho. Quando as pessoas descem do carro para retirar a tora, são rendidas", diz E. S., militar da Polícia Ambiental, que recorre ao anonimato para se proteger. "Essa guerra é um câncer que está se espalhando pelo Estado", alerta Nascimento.

Assim como consta nos panfletos da Liga, os guerrilheiros postam homens em bases nos morros com binóculos e rojão para anunciar a "invasão" de sua área por "forças inimigas". Depois de sermos monitorados de perto por grupos de motoqueiros, durante os 38 quilômetros que levamos uma hora e meia para percorrer no território dominado pela LCP, ouvimos uma saraivada de rojões anunciando nossa presença. Estávamos próximos a uma base. O alerta serve também para que os homens armados se infiltrem na mata ocupando as barricadas montadas com grandes árvores nas cercanias dos acampamentos.

"O fato é que não dá para observá-los, mas estamos sob sua mira", adverte o militar da Polícia Ambiental que nos acompanha. Na verdade, a PM Ambiental é a única força do Estado cuja presença ainda é tolerada pela guerrilha. A explicação é simples: com apenas oito agentes para cuidar de quase 900 mil hectares naquela região, eles não representam ameaça ao grupo. Antes, serão presas fáceis se assim os militantes o desejarem.

A BASE

Logo que o barulho dos rojões reverbera na imensidão da selva, as mulheres e crianças vestem seus capuzes e assumem a linha de frente. Quando se chega ao topo de um morro, depois de passar por uma barricada construída com o tronco de uma imensa árvore com a inscrição da Liga, avista-se uma bandeira vermelha tremular na franja de um acampamento de casas com cobertura de palha. Pouco tempo depois, outra barricada e chega-se a uma parada obrigatória. Do outro lado da porteira, transcorreu o seguinte diálogo com uma trupe maltrapilha, encapuzada e arredia.

- O que vocês vieram fazer aqui? - disse um nervoso interlocutor mascarado.

- Somos jornalistas e queremos saber o que vocês têm a dizer sobre a reforma agrária e a Liga dos Camponeses Pobres.

- Podem ir embora, não temos nada a dizer. Vocês só atrapalham.

- Quantas famílias estão nesta invasão?

- 300.

- Podemos falar com o líder de vocês?

- Aqui não existe líder, todos somos iguais.

- Por que vocês ficam mascarados?

- A máscara é nossa identidade.

- Vocês acreditam que podem fazer uma revolução?

- Não temos que dar satisfações à imprensa burguesa.

- De quem vocês recebem apoio?

- Não interessa.

- Podemos entrar no acampamento?

- De forma alguma. Vão embora daqui!

Com colete à prova de balas sob a camisa, saímos da porteira do acampamento por uma questão de segurança e voltamos a percorrer de carro, numa estrada precária, mais uma hora e meia até o primeiro ponto de pedágio da LCP. "No ano passado, fomos presos por eles, éramos oito militares e eles tinham mais de 50 homens armados com metralhadoras", conta o sargento da tropa. "Não tem jeito, para resolver o problema com esse bando só com uma ação conjunta do Exército, da Polícia Federal e das forças do Estado."

Ao voltar da área dominada pela LCP, fica claro, nas reservadas conversas com alguns poucos moradores dispostos a contar algo, que o terror disseminado pela guerrilha se mede pelo silêncio dos camponeses. Os revoltosos controlam a vida das pessoas, além de investigar quem é quem na região. Quem não "colabora" com eles - fornecendo dinheiro, gado ou parte da produção - vira alvo de ataques covardes. Histórias de funcionários das fazendas da região que foram colocados nus sobre formigueiros ou que apanharam até abandonar o local estão muito presentes na memória dos moradores. As torturas praticadas pelos bandoleiros contra trabalhadores rurais dificultam até contratação de mão-de-obra na região. "Ninguém quer trabalhar mais na minha fazenda", admite Sebastião Conte, proprietário de 30 mil hectares de terra. Ele teve parte de sua terra "tomada" há dois anos pela LCP, a sede da fazenda foi queimada, assim como seus tratores, alojamentos e área do manejo florestal. O fazendeiro, acusado pela Liga de ser um latifundiário, é prova de que o terror da guerrilha é igual para todos. Segundo ele, nos últimos dois anos, teve que enterrar três de seus funcionários. "Todos eles assassinados barbaramente", diz Conte. "Estou pedindo socorro. Não sei mais a quem recorrer."

Longe de lá, na cidade de Cujubim, os trabalhadores rurais empregados das fazendas não dispensam o porte de armas. "Aqui ou você anda armado ou está morto", diz M.L. O capataz da fazenda e seu filho já perderam a conta de quantas vezes trocaram chumbo com os mascarados que tentam invadir a fazenda. Tratados como paramilitares, os funcionários das fazendas são, depois dos fazendeiros, os alvos prediletos dos ataques da Liga. Nelson Elbrio, gerente da Fazenda Mutum, teve o azar de cair nas mãos da "organização". Ele foi rendido exatamente como os militares da Polícia Ambiental e ficou preso sob a mira de uma arma por seis horas. "Assim que eu fiz a curva na estrada dei de cara com uns 15 homens encapuzados e fortemente armados. Eles me tiraram do carro e a partir daí vivi um inferno", conta Elbrio. "Eles queriam que eu revelasse os segredos da fazenda: quantas pessoas trabalhavam lá, depósito de combustível, se tinha seguranças armados." O sofrimento do funcionário se estendeu até o final da tarde, quando o grupo o arrastou até a sede da fazenda, dando tiros de escopeta próximo a seu ouvido. Em seguida, o obrigaram a assisti-los incendiando a propriedade e os tratores. "Nunca mais dormi bem", diz Elbrio.

Com a morte à espreita, o medo transformou distritos inteiros em zonas despovoadas - verdadeiras vilas fantasmas - e criou uma massa de gente refugiada de sua própria terra, expulsa pela guerrilha. Em Jacilândia, das 25 casas de madeira da única rua do distrito, só oito estão habitadas. Até a igreja fechou suas portas. "O povo foi embora com medo dos guerrilheiros", conta um dos moradores, um ancião que só admite a entrevista sob o anonimato. "Aqui não podemos falar nada. Para ficar de pé tem que se aprender a viver", diz o velho agricultor. O silêncio e o abandono das terras são a mais dura tradução desse novo modo de viver. Maria, a mãe do agricultor assassinado, não esperou a missa de sétimo dia do caçula. Deixou para trás os 100 hectares, onde tinha 100 cabeças de gado e a casa recém-construída. Partiu para um lugar ignorado, sob a proteção de outro filho.

O SILÊNCIO

Naquele pedaço de terra, os poucos que, apesar de tudo, permanecem na área não têm rostos ou nomes. Quando interrogados pela polícia na apuração dos crimes, eles se tornam também cegos e surdos. "Não existe testemunha de nada", reclama o delegado Gonçalves. A razão das infrutíferas apurações policiais é que os insurgentes presos são facilmente liberados pela Justiça. "Como eles usam a tática guerrilheira do uso de máscaras em suas ações, nós ficamos de mãos atadas para puni-los. Nunca se sabe quem de fato matou", queixa-se o delegado. As únicas lideranças da LCP a enfrentar a prisão por causa de assassinatos foram Wenderson Francisco dos Santos (Russo) e Edilberto Resende da Silva (Caco), que se encontra foragido. Os dois foram acusados de participar do assassinato do trabalhador rural Antônio Martins, em 2003. Russo foi absolvido em primeira instância e os promotores recorreram da decisão ao Tribunal de Justiça.

A ABIN SABE

Essa tensão é o pano de fundo de uma guerra psicológica que os ideólogos da organização avaliam como a ideal para que a área seja abandonada pelos fazendeiros. "A melhor forma de desocupar a área é destruindo o latifúndio", nos disse um dos mascarados, chamado de Luiz por um colega. Na lógica da LCP, os fazendeiros têm que tomar prejuízo sempre, senão eles não abandonam a terra. À frente de 300 famílias da invasão da Fazenda Catanio, uma propriedade de 25 mil hectares, o guerrilheiro Luiz defende o confisco do gado para matar a fome dos invasores e considera que a "tomada" de terra é a forma legal de fazer uma "revolução agrária". "Se esperarmos a Justiça, ficaremos anos plantados aqui", diz ele.

A audácia dos militantes da LCP é tanta que no ano passado mais de 200 deles marcharam encapuzados pelas ruas do município de Buritis, a 450 quilômetros de Porto Velho, até parar na porta da delegacia, onde exigiram a saída do delegado Gonçalves da comarca. Motivo: ele tinha prendido um dos líderes da facção guerrilheira. Não satisfeitos, os bandoleiros bateram às portas do Ministério Público e da Justiça exigindo que os titulares dos órgãos também se afastassem. O fato foi reportado ao Ministério da Justiça, ao presidente Lula e ao governo estadual. Até agora, não houve nenhuma resposta. "Ninguém leva a sério nossas denúncias. Eles pensam que estamos brincando, que a denúncia de guerrilha é um delírio", indigna-se o delegado Gonçalves. "Isso vai acabar numa tragédia de proporções alarmantes, e aí sim vão aparecer os defensores dos direitos humanos", critica ele. É exatamente nessa desconsideração das denúncias de promotores, juízes e militares que a Liga ganha força e cresce impunemente.

Tão trágica quanto o terror que esse grupo armado impõe às comunidades rurais é o fato de os governos estadual e federal saberem da existência desse bando armado - e não fazerem nada. Segundo o Dossiê LCP, um relatório confidencial da polícia de Rondônia, com 120 páginas, encaminhado em dezembro passado à Agência Brasileira de Inteligência (Abin), ao Exército e ao Ministério da Reforma Agrária, o grupo armado, além de cometer todo tipo de barbaridade, é financiado por madeireiros ilegais. Conforme o documento, a LCP controla uma área estimada em 500 mil hectares, onde doutrina mais de quatro mil famílias de camponeses pobres espalhadas por mais de 20 assentamentos da reforma agrária distribuídos pelos Estados de Minas Gerais, Pará e Rondônia. "Eles estão na contramão do que é contemporâneo. Mas, de fato, formaram um 'Estado' paralelo", entende Oswaldo Firmo, juiz de direito da Vara especializada em Conflito Agrário do Estado de Minas Gerais.

FORÇA-TAREFA

Documentos em poder de ISTOÉ comprovam que as autoridades federais têm feito ouvidos de mercador para o problema. No dia 11 de janeiro de 2008, o ouvidor agrário do governo federal, desembargador Gercino José da Silva Filho, acusou o recebimento das denúncias encaminhadas a ele sobre as ilegalidades cometidas por integrantes da Liga dos Camponeses Pobres. Mais uma vez, nada foi feito. "Eles dizem que sabem de tudo, mas cadê a ação?", questiona o major Nascimento, comandante da Polícia Militar Ambiental de Rondônia. "Essa situação aqui só será resolvida em conjunto com outras forças militares", admite o major. Foi o que aconteceu no Estado do Pará, em novembro passado, na chamada Operação Paz no Campo, quando uma ação envolvendo o Exército, as polícias civil e militar e a Polícia Federal desocuparam um acampamento da LCP na Fazenda Fourkilha, no sul do Estado. Com dois helicópteros, 200 homens e 40 viaturas, a força-tarefa cercou o local, prendeu cerca de 150 militantes e recolheu um verdadeiro arsenal de guerra. "Precisamos da mão forte do Estado. Aqui somos tratados como cidadãos marginais", emenda o fazendeiro Sebastião Conte.

Foto: O MAPA DA MINA.





























Publicado na Revista "ISTOÉ".
Edição nº 2003 de 26 de março de 2008.





N.R. Saiba mais sobre esta grande merda de LCP clicando no link abaixo:

Liga dos Camponeses Pobres – Carlos I. S. Azambuja
 
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